Relato pessoal: A menina que não gostava de futebol

A história que eu vou contar é de uma menina que conheceu o futebol de uma forma natural e que a paixão foi logo “de cara”

O ano era 2009 e ela estava de férias da escola. Passando os canais televisivos, parou em um que transmitia uma partida de futebol. No começo relutou, ainda procurou por outras programações, mas resolveu deixar naquele jogo.

Os únicos jogos que assistia eram nas Copas do Mundo, então, ali ela não conhecia nem um dos lados e, tampouco, regras. A partida já tinha o seu início, marcando no cronômetro 16 minutos e o placar em 0 a 0.

A garota, por mais que no primeiro momento estivesse entediada, se ajeitou no sofá e começou a prestar ainda mais atenção aos lances. Jogadas, alguns dribles, movimentação, faltas, escanteios, tiros de meta. O narrador falava sobre uma tal de “posse de bola” e ela franzia a testa procurando entender o que era aquilo.

A partida se encerrou em 3 a 0 e logo após o apito final, por curiosidade, resolveu procurar o que tinha acabado de assistir. Vejamos, o ano era 2009 e nem todas as redes sociais existiam, o que restou foram algumas anotações do Google para que no outro fim de semana, ela pudesse acompanhar novamente um dos times em campo.

Depois de algumas rodadas, ela percebeu que já compreendia o “dialeto” do narrador e dos comentaristas, sabia sobre alguns dribles e o que estava acontecendo nas quatro-linhas. Então se questionou: “o que eu estou fazendo é certo?”. Para ela, futebol não era para mulheres. Ela não deveria assistir aquilo. Resolveu então esquecer e passou algumas rodadas sem acompanhar o time jogar. Nervosa em busca dos resultados, ela decidiu voltar, e dessa vez, foi além.

Se ela já conseguia compreender o que assistia, poderia então estudar sobre o esporte. E ela foi. De pouco em pouco, sem deixar que a voz a falasse para parar. Lia, anotava, questionava os amigos e passava a assistir mais jogos. Passou a virar uma diversão.

Aprendeu que o futebol nasceu dos operários, que as regras eram muito parecidas com do rúgbi, que o norte da Inglaterra era a região onde mais se praticava e, o principal, era visto como uma atividade física para disciplinar os alunos.

A garota já não mais estava encantada com a torcida, com uma equipe, com o jeito de brincar os pés com a bola dos jogadores. Ela estava apaixonada pelo futebol. Pela camisa, pela história, pelo esporte.

Demorou muito para que pudesse contar a sua família. Um ano e alguns meses até que ela tomasse a liberdade – ou diria coragem? – de falar. E a forma foi a mesma em que o futebol entrou na sua vida: naturalmente, sem data e hora marcada.

Sentada no sofá da sala da casa dos seus avôs, ela decidiu falar sobre a convocação da Seleção Brasileira para a Copa do Mundo da África do Sul. Comentava os nomes, opinando e surpreendendo ao seu avô e pai. Afinal, ela não assistia jogo e como sabia o que era um centroavante? Mas ela disse que assistia, que gostava e até o time que torcia.

Essa garota continuou e continua estudando sobre o futebol porque hoje não é mais só um esporte ou hobby, é o futuro trabalho (assim ela espera).

Essa garota, que tinha 11 anos quando assistiu a partida sozinha, hoje é uma mulher com 23, que mudou totalmente o pensamento sobre o esporte e esvaziou da mente a ideia de que ele era somente para homens.

Essa garota que naquele ano chegou a chorar por uma derrota, hoje também chora. Aquela garota que um dia perdeu a voz assistindo uma partida e teve que apresentar um trabalho na escola no outro dia quase rouca, cresceu e perde a voz também.

Aquela menina de 11 anos jamais imaginaria estar apaixonada por futebol com 23 anos. Jamais imaginaria levar para o lado profissional, pensar em ser reconhecida por amar um esporte, jamais pensou amar esse esporte.

Aquela garota sou eu. E eu posso dizer que, amando o futebol e tudo o que eu já vivi nele, afirmo que não é só uma partida. Não é só para quem pode, não é só para um gênero. Ele é para todos e não podemos apagar a memória e história deixada.

Foto de destaque: Reprodução/Arquivo pessoal

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