Edson Arantes do Nascimento, o nosso Rei Pelé, atuava como atacante e é mundialmente considerado um dos maiores de todos os tempos, mas nem sempre foi assim
Pelé nasceu em Três Corações-MG, em 23 de outubro de 1940, filho do ex-jogador do Fluminense João Ramos do Nascimento e Celeste Arantes. Pelé recebeu seu primeiro nome em homenagem ao inventor estadunidense Thomas Edison.
Marcou 1.281 gols em 21 anos, foi artilheiro paulista por dez anos consecutivos e tem mais de 60 títulos conquistados, entre eles o tricampeonato mundial pela Seleção Brasileira. Dizem que seu talento com a bola foi capaz até de parar uma guerra.
Origem do apelido ‘Pelé’
Edson recebeu o apelido “Pelé” na época da escola, por conta da forma que pronunciava o nome de seu jogador favorito, o goleiro Bilé, do Vasco da Gama de São Lourenço, o qual falava de forma equivocada e, quanto mais se queixava, mais o nome pegava. Em sua autobiografia, Pelé afirmou que não tinha ideia do que o nome significava, nem seus velhos amigos.
O começo no Santos
Em 1956, Brito levou Pelé para a cidade de Santos para experimentar jogar para o time profissional do Santos Futebol Clube, dizendo à administração do clube que o jovem de quinze anos seria “o maior jogador de futebol do mundo”.
Pelé impressionou o treinador do Peixe, Luís Alonso Pérez (Lula), no Estádio Urbano Caldeira e assinou um contrato profissional com o clube em junho de 1956. Ele foi muito divulgado na mídia local como uma futura estrela. Pelé fez a sua estreia em 7 de setembro de 1956, com quinze anos, contra o Corinthians de Santo André, e teve um bom desempenho em uma vitória de 7 a 1, marcando o primeiro gol de sua carreira profissional durante a partida.
Racismo na carreira
Pelé sentiu o racismo em vários momentos da carreira. Assim que chegou ao Santos, Pelé passou a ser chamado de “Gasolina” pelos outros jogadores do time. O apelido se referia à cor da substância que dá origem a esse combustível, o petróleo, negro como a pele do recém-chegado. E ficou vivo tempo suficiente para Edson pensar que seria assim que ele ficaria conhecido no mundo do futebol.
A imprensa paulista preferiu chamá-lo de Pelé, apelido que veio na infância em Bauru. Mas na Copa de 1958, seus companheiros começaram a chamá-lo de outra coisa: Alemão. Era uma ironia que marcava a clara oposição entre o seu tipo físico – e a cor de sua pele – e o dos atletas europeus.
O “Alemão” foi abandonado ainda na Suécia, mas Pelé continuaria a ser chamado, ao longo da carreira, por outras palavras que remetiam à cor de sua pele, como se essa característica física fosse definidora de sua personalidade. “Crioulo” é o termo que mais aparece nos jornais dos anos 60 em referência a ele. Em geral, a palavra foi usada de maneira intencionalmente afetuosa, embora seu uso exponha um discurso racista que define socialmente uma pessoa negra a partir da cor de sua pele.
No Senegal, durante uma excursão do Santos certa vez, a recepcionista branca do hotel onde o time brasileiro se hospedou chamou de “selvagens” os torcedores negros que tentavam se aproximar dos santistas. Ela foi advertida por um policial e encaminhada à delegacia na hora.
Senti que aquilo representava uma esperança para os africanos, como o negro que conseguiria fazer sucesso no mundo”, escreveu Pelé em sua autobiografia publicada em 2006.
O autor de mais de 1.200 gols acredita que a situação é melhor atualmente em função da atuação da imprensa, entre outros fatores.
No meu caso, quando terminava o jogo, todos vinham me abraçar e pedir desculpas. Atualmente, acho que é bem diferente. Há mais respeito e a imprensa está mais presente”.
Quando a Seleção Brasileira conquistou seu primeiro título mundial, Pelé foi o personagem principal de uma reportagem da revista Cruzeiro, na qual ele é comparado à figura folclórica do Saci-Pererê. Na mesma revista, um texto que descreve a passagem dos jogadores brasileiros pela Suécia sugere que uma criança loira se assombraria com a presença negra de Pelé e exclamaria ao ouvi-lo dizer alguma coisa: “Mamãe, mamãe, ele fala!”.
Pelé, assim, é comparado a um animal, cuja capacidade de falar seria uma surpresa.
Toda a descrição desses momentos está na biografia ‘Pelé: estrela negra em campos verdes’, de Angélica Basthi, um livro que aborda a relação do jogador com a questão racial.
Mesmo já considerado o maior jogador do século e inspiração para milhões de negros no mundo todo, Pelé nunca se engajou na luta antirracista e chegou a ser cobrado por isso ao longo da carreira.
Certa vez, ao comentar o enfrentamento do goleiro Aranha ao racismo sofrido durante um jogo, Pelé disse que o ex-santista se precipitou. Segundo o Rei, se ele tivesse parado todo jogo em que algum torcedor o chamasse de “macaco” ou “crioulo”, teriam que ser interrompidos todos os jogos de que ele participou.
De acordo com Angélica Basthi, o fato de ele ter reconhecido ter sofrido ofensas raciais em campo é um ponto de inflexão em sua trajetória.
“Pelé passou a vida negando que tivesse sofrido racismo. É a primeira vez que admite ter sido chamado várias vezes de macaco ou de crioulo em campo”, afirma a pesquisadora.
Pode-se dizer que é um pequeno avanço contar com esse reconhecimento do Pelé no debate sobre o racismo no futebol, ainda que o contexto utilizado por ele não contribua com a luta por igualdade racial. Mais uma contradição, resultado do racismo produzido em nosso país”.
O racismo da sociedade brasileira também faz com que Pelé seja julgado de forma implacável por todos os seus erros.
“Sua figura é interessante para pensar a questão racial porque ele reúne vários fatores, entre eles a imagem na qual ele próprio investiu de homem perfeito. O homem branco perfeito é completamente diferente do homem negro perfeito. O homem negro é cobrado para ser impecável”, analisa a jornalista Angélica Basthi.
“Ele abraçou essa ideia do homem perfeito. Só que ele é um homem negro. Então a sociedade, quando olha o Pelé, olha esse homem negro. Cadê essa perfeição? As pessoas fazem vista grossa para outros jogadores, mas não para ele. O julgamento é implacável. E é implacável com esse conteúdo racial, sim. O homem negro perfeito que o Pelé deveria ser e bancar: não pode errar, tem que ser esse homem que não existe”.
Seleção Brasileira
Passados dez meses da contratação de Pelé pelo Santos, o garoto foi convocado pela Seleção Brasileira pela primeira vez para disputar a Copa Roca (atual Superclássico das Américas). A competição era um torneio amistoso entre a Seleção Brasileira e a Seleção Argentina.
As duas partidas foram realizadas no Brasil. A primeira marcou a estreia de Pelé com a Amarelinha e foi realizada no Maracanã. A Argentina venceu por 2 a 1, e o gol brasileiro foi marcado por Pelé. Na partida de volta, no Estádio do Pacaembu, o Brasil venceu por 2 a 0, com um gol de Pelé e outro de Mazzola. Foi o primeiro título de Pelé pela Seleção Brasileira.
Pelé é, até hoje, o jogador mais novo a vencer uma Copa do Mundo. Com apenas 17 anos e 8 meses, Pelé foi campeão do mundo em 1958, na Suécia. O então garoto fez seis gols em sua primeira Copa e foi o artilheiro do Brasil. Nessa edição, Pelé foi chamado pelos franceses de Rei do Futebol.
O primeiro gol de Pelé em uma Copa do Mundo foi contra o País de Gales, nas quartas de final do Mundial de 1958. O feito também concede a Pelé o recorde de jogador mais novo a fazer um gol em uma Copa.
Na Copa da Suécia, os dirigentes brasileiros esqueceram de enviar a numeração dos jogadores para a Fifa e a entidade precisou defini-la. Pelé era reserva e recebeu a camisa 10, número que ficou eternizado em suas costas. Por causa de Pelé, os jogadores mais habilidosos passaram a usar a camisa 10.
Foto de destaque: AFP via Getty Images