O preconceito rodeia várias mulheres no esporte, em principal, no brasileiro
Dia 19 de agosto é marcado pela celebração do orgulho lésbico. Neste mesmo dia, em 1983, um grupo de mulheres homossexuais se uniram para protestar contra a lesbofobia que haviam sofrido no Ferro’s, um antigo bar em São Paulo. Essa luta contra o preconceito vem de anos, e ela tem uma grande relação com o futebol e o futsal feminino.
Para começar, na sociedade, há um tipo de estereótipo que já relaciona a mulher que é jogadora como lésbica. Não, eles nem questionam, somente afirmam. Essa associação não repercute em todos os esportes, os enfoques são o futebol e futsal feminino por serem jogos associados à masculinidade.
Eu até brinco: ‘você já foi ver jogo de vôlei? É lindo, né? As meninas femininas, aquele shorts ‘agarrado’, você acha maravilhoso’. Mas vai lá no vôlei para ver se não tem mulher que namora mulher. Está mais que no momento de explicarmos para as pessoas que o que elas fazem não têm nada a ver com a orientação sexual delas”, diz Ale Xavier.
O preconceito fica nos olhos de quem está de fora e acaba sendo levados para futuras gerações. Os cantos homofóbicos e os xingamentos da torcida mexem muito com essa parte problemática do esporte. Infelizmente, temos um futebol homofóbico e machista, no qual a mulher já não é bem vista, imagina uma mulher que gosta de outras pessoas do mesmo sexo. A cada dia mais, a torcida vem proliferando esses erros e as jogadoras homossexuais têm um papel importante nessa luta, o de se posicionar.
A invisibilidade do ‘L’ na sigla LGBTQIA+ ainda é imensa, mesmo com o crescimento que ocorreu nos últimos anos. Quando ocorre um posicionamento em um perfil de uma atleta que tenha o mínimo de visibilidade, isso se torna uma influência boa às futuras gerações que consomem esse conteúdo. Tudo isso resume-se na importância de levantar uma bandeira e impor um respeito necessário.
Naturalmente, você tem um processo de aceitação. Eu lutava contra um sentimento, sabia que gostava, que amava, mas tinha um problema muito grande de aceitar. Especialmente quando eu ia para minha cidade. Parecia que eu necessitava ficar com um homem (…) Porque já falavam que eu era gay por causa do futebol”, diz Alline Calandrini.
A última pesquisa encontrada afirma que, em apenas os dois primeiros meses de 2018, ocorreram 26 casos de assassinatos de mulheres lésbicas. Sendo que de 2014 a 2017 já havia ocorrido um aumento de 150% dos casos de morte.
Na relação que há entre a lesbofobia e o esporte, pode ser comentado a existência de uma maneira de aceitação ou de diminuição do preconceito. O que ocorre é que uma série de meninas que sonham em ser jogadoras de futebol acabam desistindo de tudo por conta dessa associação, como conta a apresentadora Ale Xavier.
O preconceito no futebol feminino é toda mulher ser taxada de sapatão só por jogar bola. Esse foi um dos motivos que me ajudou a desistir, jogou contra a minha carreira (…) Eu fiquei 22 anos escondendo de mim mesma quem eu era, não foi fácil”.
Com a problematização que ocorre na sociedade atual, qualquer inspiração pode se tornar o empurrão necessário que a pequena menina precisaria ter. O esporte é uma ferramenta de mudança em vários sentidos.
É importante ressaltar, caso não tenha ficado claro, que a orientação sexual de uma pessoa não tem nenhuma relação com o esporte que ela pratica ou deixa de praticar. O encantador de uma atividade física, além de ser a ferramenta de mudança, é que dentro dele pode haver um acolhimento que deixe a pessoa mais confortável e segura.
Eu acho que o esporte tem tudo a ver com a questão social, cultural e democrática. Especialmente o futebol, que é a linguagem de todos. Quanto mais pessoas se manifestarem, mais pessoas reconhecidas, mais bacana vai ser. O futebol feminino é muito pouco nisso, nós vemos poucas atletas se manifestando”, contou Calandrini.
Se formos pensar nos times de várzea, aquela “pelada” feminina que jogamos aos finais de semana, acaba virando uma família.
O primeiro medo é você se aceitar. Você fica com medo de tudo que é imposto pela sociedade, de que isso é errado, que você estava fazendo algo errado. O segundo medo é da sua família, se eles vão te aceitar”, comentou Ale Xavier.
Nem tudo é pedra nessa estrada
Como comentado, a visibilidade em torno da famosa letra ‘L’ vem crescendo ao longo dos anos. Com isso, os times perceberam que não podem deixar algumas coisas de lado, mais relacionado com toda comunidade LGBTQIA+.
O posicionamento dos clubes de camisa vem aumentando e é possível ver posts falando sobre o assunto. Porém, somente uma publicação na rede social não conta de nada, pensando que ocorre preconceito dentro e fora do estádio.
Na última semana, o Santos FC publicou a foto do casamento entre sua atacante Cristiane e a atual esposa Ana. Talvez um divisores de águas para uma luta tão grande.
Além das publicações, foi levantado no começo de 2020 uma medida de punição ao torcedor que praticar um ato homofóbico ou transfóbico no estádio. Ainda não há nada concreto sobre isso, mas é possível acompanhar uma mudança no pensamento.
Comentando sobre modificações, é necessário falar sobre a campanha da Leia Corner intitulada de “Pede a 24”. Um movimento criado para tentar desvincular a figura de um número, que no jogo do bicho significa veado, ao preconceito homofóbico culturalmente instalado.
As coisas vêm mudando e tomando novas formas quando falamos do preconceito. Mas ainda falta muito, ainda é preciso quebrar estereótipos, barreiras, mudar muitas coisas. A cada dia, um novo passo.
Eu acho que vai demorar um pouquinho para gente mudar a cabeça de alguns torcedores. Estamos em 2020 e vemos ainda ‘viado e bicha’ como xingamentos (…) Quanto mais a gente falar, melhor. Tem que ter paciência nisso, porque ainda tem gente sem noção que vai para os estádios”, finalizou Alline Calandrini.
Foto de destaque: Reprodução/Instagram Cristiane